A neurociência avança de tal forma que não pode ser mais ignorada sua relevância e aplicabilidade em diversos campos, seu caminho é um caminho sem volta, e com o principal: resultados surpreendentes.
Nesse artigo, ou melhor, nesse nosso “bate-papo” iremos falar especificamente da aplicação de alguns pontos dentro do “universo” da neurociência e sua profunda ajuda na melhoria contínua do processo de “gestão”. Seja para você que atua em alguma empresa, para você que é empreendedor ou almeja empreender no futuro ou até mesmo para você, que não pertence a nenhum desses grupos (ainda) e é apenas um curioso do tema, sem dúvida irá se beneficiar desta leitura.
Para isso, eu dividi esse nosso papo em 3 partes, na primeira parte falaremos um pouco sobre a “neurociência” de forma a elucidar melhor o porquê ela vive a “era de ouro”, bem como um olhar para o futuro promissor atrelado à tecnologia e à própria transformação em que o mundo vive, na qual o mantra é “adapte-se ou adapte-se”.
Klaus Schwab, menciona a seguinte frase em seu indispensável livro: “A quarta revolução industrial” para quem quer entender esse novo contexto que estamos inseridos: “Estamos a bordo de uma revolução tecnológica que transformará fundamentalmente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos.
Em sua escala, alcance e complexidade, a transformação será diferente de qualquer coisa que o ser humano tenha experimentado antes”. Na segunda parte falaremos sobre “gestão”, afinal, o que entendemos por “gestão”? O que mudou na gestão? Qual o futuro da “gestão”?
Por fim, na terceira parte, falaremos da semiose considerando o tema: “neurogestão”, ou seja, o significado da junção dessas duas grandes coisas: neurociência + gestão e sua vasta aplicação.
Parte 1:
Você é seu cérebro, portanto não é desejável conhecê-lo, é fundamental. Essa é uma das afirmações mais assertivas quando o assunto é ser-humano, nós, nossa espécie. A ciência que se dedica a estudar ele, é a neurociência, ou seja, estuda o funcionamento cerebral.
Com o advento do grande avanço da tecnologia de imageamento cerebral (ressonância magnética funcional), entre outros avanços tecnológicos, como a biologia molecular, eletrofisiologia de múltiplos canais e por aí vai, tornou-se possível investigar mais a fundo cérebros vivos.
Sejam de forma indireta, como cobaias em laboratório, ou direta em pessoas que se tornam voluntários dispostos a se submeter a diversos tipos de testes que envolvem situações específicas (como observação de imagens) ou jogos específicos, com o objetivo de ver o “percurso” gerado por esses “estímulos” bem como o resultado deles.
Nosso “cérebro” é um sistema altamente complexo e sensorial, que recebe informações do “meio” ao tempo todo, processa essas informações (grande parte de forma inconsciente) e reage a elas.
Questões relacionadas a neuroanatomia, que antes eram restritas a um grupo muito restrito e específico de cientistas e médicos, se popularizaram, como, por exemplo: o papel do córtex pré-frontal que é o controle das funções executivas, o papel da amígdala na aquisição de “experiências”, bem como o sistema límbico no papel das emoções, hoje fazem parte de cursos on-line, de revistas específicas com uma linguagem acessível e de artigos, como este. Quem ganha? Todos nós.
Além de questões, envolvendo a neuroanatomia e seu respectivo funcionamento, nunca foi tão estudado e falado sobre alguns “neurotransmissores”, que se tornaram “celebridades” e ficaram mais conhecidos após uma revolução nos fármacos (medicamentos) e da interface com a sociedade, que avançaram significativamente nessa área, tais como os famosos “inibidores de receptação da serotonina”, “agonistas dopaminérgicos”, receptores dopaminérgicos e da ocitocina, entre outros. As pessoas queriam (e querem) entender melhor o papel desses neurotransmissores.
Queremos, através da neurociência, entender como: pensamos, sentimos e agimos (comportamentos). Queremos desvendar a consciência e inconsciência, queremos entender melhor as emoções e o porquê ela é o que temos de melhor e pior. Ou seja, termos uma melhor “gestão emocional” fará (e na minha opinião sempre fez) a diferença, seja na sua vida pessoal, seja na sua vida profissional.
Se interessar e estudar você, sob a perspectiva de que você é seu cérebro, de que é inteligente e assertivo, pois embora cérebros sejam iguais considerando sua fisiologia, são únicos, por uma simples razão: nossa experiência, ela é única, ela é sua, ela é minha.
Posso afirmar que é uma viagem divertida e fascinante e que quanto mais você entende seu cérebro mais você entende você e com isso, você consegue “gerenciar” melhor as consequências das suas escolhas para ter o que todos queremos: um cérebro saudável e performático, não é mesmo?
Parte 2:
Desde sempre fazemos “negócios”, mesmo nas primeiras civilizações, as pessoas pensam em negócios. Os antigos egípcios, maias, gregos, romanos, sabiam que a criação de riqueza através do comércio era fundamental para a obtenção de “poder”, além de garantir a base sobre a qual a civilização poderia prosperar.
Segundo Edward D. Jones, um banqueiro norte-americano (1893 -1982): “A arte da administração é tão velha quanto a raça humana” e enquanto povoarmos esse planeta teremos que “administrar” bem ele, acrescento: e nós mesmos e tudo a nossa volta, não é mesmo?
Os termos “gerente” e “gerenciamento”, são relativamente recentes considerando nossa história, eles surgiram no final do século XVI, palavras essas intimamente relacionadas a sua grande mãe: a “gestão”- ação de gerir, de administrar, de governar ou de dirigir negócios públicos, ou particulares.
A “gestão” ganhou evidência e relevância (movida pela revolução industrial da época, onde o capital humano entra no jogo) em 1970 quando o Dr. Alfred Chandler avançou na área da administração enfatizando a “capacitação organizacional” e o “aprendizado contínuo” em seu curso da Havard business School.
Com isso, grandes pesquisadores, teóricos e estudiosos do campo avançaram ainda mais a partir de 1980 e 1990, sendo referências até os dias de hoje em vários modelos de gestão que são extremamente eficientes, entre eles: Michael Porter, Igor Ansoff, Rosabeth Moss Kanter, Henrry Mintzberg e o emblemático e na minha opinião, o grande pai da gestão: Peter Druker. Esses foram os encorajadores de fazer com que as empresas/organizações estudassem profundamente o ambiente em que se inseriam, bem como as necessidades das pessoas (consumidor), permanecendo sempre abertas a mudança.
No ano de 2000, impactado pela era da internet, avanço da comunicação e mercados globalizados e possibilidades jamais imaginadas em termos de negócios, surgem as famosas empresas de garagem e revolucionam a forma de fazer negócio, era o momento de ser ágil e aprender rápido, afinal o e-commerce e as milhares de “.com” e inicia um boom de empreendedores o que é super saudável para a economia de um país.
A partir daí, ano a ano, a velocidade das coisas foi exponencial e com isso vieram oportunidades no qual bastava um lap top e uma boa ideia para fazer acontecer e monetizar algo. Nisso vem as redes sociais, a mobilidade (smartphones) e uma revolução no qual é praticamente impossível gerir um negócio sem ser de forma “hibridizada” – mundo real e mundo virtual.
Você até pode pensar em qualquer negócio e não estar presente na mídia social, como uma resistência ou até mesmo uma estratégia, porém, uma coisa não está na sua esfera de controle: alguém falar de você, não para 1, ou 2, 10 pessoas sobre seu produto e/ou serviço, mas sim para milhões em apenas uma postagem. Isso mudou o jogo.
Entra nesse momento um novo “player”: o indivíduo conectado a tudo e a todos que não precisa de permissão para postar o que quiser, com isso, perde-se o controle e as empresas entendem que o jogo mudou e quem manda são dois novos protagonistas: o cliente e seu colaborador (funcionário), eles decidem.
Sempre digo de forma bem simples que “gestão” é ter claro seu “plano de negócios” (marketing/vendas, canais, relacionamento com os clientes, atividade-chave, proposta de valor, estrutura financeira) e muita clareza e controle em três aspectos: “gestão de produtos/serviços”, “gestão de processos” e “gestão de pessoas”, sim, todos dão muito trabalho, mas advinha em qual gestão é o principal desafio? Sim, isso mesmo, na “gente”.
Por fim, se você não tem clareza do que é exatamente e o que significa isso, provavelmente a “gestão” da sua empresa/negócio/organização pode ser impactada: BSC (Balance Score Card), Canvas Business Model Generation, Kaizen, SixSigma, Lean, Project Canvas, Design Thinking, Scrum, PDCA, IA (inteligência artificial), VR (realidade virtual), Gamification, e por aí vai…
Não temos mais espaço em gestão para escolhas, por exemplo, de se manter no modo “analógico” (não querer ser “digital”), o “ser digital” passa a ser mandatório para fazer negócio, fazer vídeos, criar conteúdo e desaprender para reaprender. Quem aprender melhor e mais rápido terá uma grande vantagem competitiva.
Portanto, se você ainda pensa se “tem que” ter “Insta”, criar um podcast ou criar conteúdo relevante no seu LinkedIn e compartilhar, atualizar seu site (e por favor, deixá-lo responsivo), vários já estão na sua frente, portanto minha sugestão: corre lá e bem-vindo à “transformação digital”, fundamental para gerir qualquer negócio.
Parte 3:
Que venha a neurociência e me ajude na “gestão” do meu negócio, e aí emerge e surge a “neurogestão”. Para gerir bem um negócio precisamos de competências específicas que são exigidas pela própria natureza do negócio, portanto se eu, através do conhecimento provido pela neurociência, posso dar potência a essas competências de forma a “performar” melhor, minha pergunta é: Por que não?
Para a gestão de um negócio, algumas “competências” são essenciais e nos próximos anos, segundo o Fórum Econômico Mundial, avançam vários pontos à frente de outras, entre elas estão:
- Comunicação;
- Capacidade de solução de problemas complexos;
- Criatividade;
- Habilidade em vendas/negociação;
- Gestão emocional;
- Pensamento Sistêmico;
- Aprendizagem;
- Colaboração;
- Alfabetização de novas tecnologias (be digital);
E onde entra a neurociência? Em tudo. Através de conhecimentos específicos e treinamentos específicos com metodologias considerando a neurociência, o resultado do incremento dessas competências, quando comparados aos métodos tradicionais, são incomparáveis.
São considerados, desde ambientes (que são fundamentais para o processo de aprendizagem), área também conhecida como “neuroarquitetura”, até a escolha de um determinado alimento no “coffee break” que pode aumentar a concentração de “acetilcolina” (neurotransmissor que atua no aprendizado, entre outras funções), bem como a própria “metodologia” do treinamento em si, onde são analisados vários fatores para tornar mais “eficiente”, tudo sob a ótica da neurociência.
“People learning by doing” – pessoas aprendem fazendo, o “erro” também é fundamental para o processo de aprendizagem e o aperfeiçoamento só vem com a “repetição”, ambas estratégias adotadas quando utilizamos a “neurogestão”.
Concluo com um “bônus” para você que esteve comigo nesse papo até aqui, de algumas informações importantes sobre o funcionamento do nosso cérebro e desejo que faça um ótimo proveito delas e até a próxima!
1O cérebro não realiza muitas atividades ao mesmo tempo,
- A Informação é estocada em diversas áreas
- A aprendizagem é modulada quimicamente
- O significado é inato do ser humano
- Nossas emoções são críticas para padronização e memória
- Aprender envolve também foco e percepção periférico.
- O cérebro é social, aprende melhor com outros cérebros
- O aprendizado complexo é ativado pelo desafio e inibido pelo estresse agudo.
Flávio Maneira: Mentor do Sales Clube, Executivo do setor da saúde há +25 anos, atuou em empresas como: Novartis, Schering-Plough, MSD, Biolao e Medtronic, responsável pelo “Commercial Training” na América Latina. Idealizador do “Braintalks, neurociência ao
alcance de todos, professor de Neurociência do Einstein Ensino e da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de SP. Palestrante de assuntos ligados a gente”, “performance”, “neurociência” e “futuro. Palestrou no TEDX com o tema: Conhecimento que transforma. Em 2023 lançou seu livro: Neuromanagement, cérebro e a gestão do futuro de pessoas e organizações.
Referências:
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